Um dos argumentos muito utilizado pelos defensores das praxes é que elas contribuem para a integração social dos alunos no meio académico.
A expressão integração social encerra um conceito que consiste no cumprimento dos deveres e no uso dos direitos da comunidade de acolhimento pelos novos elementos a integrar. Na prática, leva a que a pessoa se sinta bem no novo ambiente de acolhimento, livre e voluntariamente, em pé de igualdade.
Neste sentido, parece justificar-se a existência de medidas/ajudas para a integração dos alunos, em especial os do primeiro ano, chamados caloiros, tendo em atenção que existe uma descontinuidade entre o ensino secundário e o ensino superior, por um lado, no seu funcionamento, conteúdos e suas finalidades e, por outro lado, a diversidade étnico-cultural dos alunos que chegam ao ensino superior, muitas vezes oriundos de ambientes muito diferentes.
Neste processo de integração, tanto os deveres e os direitos da comunidade de acolhimento como as medidas e práticas das praxes devem obedecer a um quadro de valores morais que deve existir em qualquer ambiente social. Em psicologia, existem várias teorias de desenvolvimento moral e da moralidade mas a que tem um cariz mais universal é a teoria cognitivo-desenvolvimentista numa perspetiva da justiça que utiliza o raciocínio moral e assenta em princípios e valores morais universais cuja regra de ouro é: “trata os outros como gostarias de ser tratado se estivesses no seu lugar”. Como normativo de referência temos a Declaração Universal dos Direitos Humanos que, por sua vez, assenta nos três pilares da revolução francesa de 1789: “liberté, égalité et fraternité”.
Vamos ver se as praxes cumprem um conjunto de ações conducentes à compatibilização entre as suas práticas e a integração escolar dos alunos no respeito pelos valores descritos, nomeadamente os da revolução francesa. Vejamos: quanto à liberté, segundo as informações recolhidas e pela minha observação, verifica-se que os alunos são, na prática, coagidos a aderir à praxe, sendo, inclusivamente, intimidados e ameaçados de represálias caso não aceitem as praxes. Sendo assim, pode-se inferir que os alunos não são livres de escolher e não são respeitados os valores de liberdade; no que concerne à igualité, tanto o estilo e organização das comissões de praxe como as ações a praticar evidenciam uma forte hierarquia dos praxistas e, embora sejam todos alunos, os praxantes assumem uma posição totalmente diferente dos praxados e não realizam as mesmas tarefas. Nitidamente, não há igualdade na prática das praxes o que também viola as regras da moralidade e, até, da justiça; relativamente à fraternité, deveria estar presente o espírito de ver o próximo como nós mesmos, o respeito pela sua integridade humana e haver solidariedade para com todos. Acontece, porém, que há práticas nas praxes que são vexatórias, desumanas e, até, violentas mais parecendo situações de bullying e de humilhação provocando traumatismos e colocando, por vezes, a integridade física e psíquica em risco.
Posto isto, constata-se que existe uma contradição entre as práticas das praxes e o objetivo de integração dos alunos, produzindo, por vezes, efeitos opostos, levando à perturbação do ambiente académico, à intimidação e humilhação dos caloiros, podendo produzir efeitos negativos na assiduidade e frequências das aulas ou provocar danos nos alunos e na sociedade.
Conclusão: Por vezes, nas praxes são utilizados métodos reprováveis e a justificação das praxes como meio de integração escolar dos alunos não me parece aceitável.