No início de cada ano, é costume formularem-se desejos de dinheiro e saúde. Se, para o primeiro, é fundamental trabalho e sorte, para o segundo, para além de sorte e dinheiro é, por vezes, suficiente fechar um pouco a boca.
Talvez com a melhor das intenções, num ímpeto legislador e reformista, o governo decidiu controlar o que um cidadão, supostamente livre, deve consumir, elaborando para tal uma longa lista de alimentos, cerca de 60, desde as pizzas ao pastel de bacalhau, passando pelo pastel de nata ou pelo chouriço.
Dir-me-ão que esta imposição, privando- nos dos prazeres da vida a que temos direito, apenas se aplica à venda destes produtos alimentares nos bares do Serviço Nacional de Saúde e que tem um caráter moralizador, atendendo ao local de venda. Quase que concordava com o argumento mas, depois de refletir um pouco, e como a privação da liberdade individual me causa uma certa urticária, pensei na situação dos médicos e outros profissionais de saúde. Será que, ante este espírito fundamentalista, os obesos e os fumadores, sendo maus exemplos a seguir, poderão exercer funções estatais?
A legislar é no sentido de, paralelamente, ser obrigatório ter alimentos mais saudáveis disponíveis, de forma a desincentivar o uso dos outros, depois cada um faça a sua escolha.
Há uns tempos, foi denunciada pela comunicação social, a má qualidade das refeições escolares. Aqui, e também nas refeições aos doentes hospitalizados, é que o Estado deve intervir, garantindo alimentação de qualidade a quem não tem alternativa.
Sendo consensual que é necessário defender bons hábitos alimentares é também consensual que a educação é o pilar central de toda a problemática. Assim, em vez de se legislar sobre o que se pode ou não comer, legisle-se sobre a qualidade da educação e, depois, com esta poderosa ferramenta, que cada um decida sobre a sua prática alimentar.
Para mim, ter uma alimentação saudável é uma coisa, outra é praticá-la como por obrigação quase monástica. Não gosto que nos infantilizem e imponham idolatrias do corpo saudável e perfeito que, bastas vezes, por serem inatingíveis, levam inúmeras pessoas a estados depressivos.
Os excessos são certamente perigosos mas, por vezes, os legislativos poderão ser mais perniciosos que os alimentares.
Já imaginaram o que seria proibir a edição de livros com receitas demasiado calóricas?
Para terminar, e como o bom senso não impera na vida social e política, fica uma inquietação: estando provado que o excesso de sol provoca cancro de pele, os nossos legisladores estarão a redigir despacho de forma a encerrar as praias das 11 horas às 17h?
PS. “Espere o melhor, prepare-se para o pior e aceite o que vier.” – Provérbio chinês