Estava eu a preparar-me para, tranquilamente, celebrar os 50 anos do 25DEABRIL, quando sou sobressaltado na minha mais que merecida quietude pelo despropósito das declarações do Sr. Presidente da República (PR), Marcelo Rebelo de Sousa (MRS), durante um encontro gastronómico com quatro dezenas de jornalistas estrangeiros acreditados em Portugal.
Entre outras coisas o PR terá comparado a maneira de ser e de actuar do anterior e do actual Primeiro Ministro, António Costa e Luís Montenegro, o que, para além de indelicado para os visados, que não estavam lá, os colocou numa posição de inegável desconforto perante cidadãos estrangeiros, relação essa de carácter estritamente diplomático e não de conversa em família.
MRS terá dito que o novo primeiro-ministro tem “comportamentos rurais” e que António Costa era “lento” por ser oriental.
Mas o PR não se ficou por aí e terá aproveitado a ocasião para lançar umas farpas à PGR, Lucília Gago, por ter ordenado ao Ministério Público (MP), que tutela, a abertura de um inquérito contra incertos na sequência das conclusões da inspecção levada a cabo pela Inspecção Geral das Actividades em Saúde (IGAS) sobre o caso das gémeas.
E ainda resolveu, vá lá saber-se porquê, manifestar a opinião de que, no caso da descolonização, não chega pedir desculpas aos povos colonizados, mas que Portugal deverá assumir as culpas e pagar as indemnizações devidas pelas eventuais consequências da escravatura e da exploração dos povos colonizados.
Estilos à parte, já que cada um tem os seus, fica mal ao Presidente da República falar ou dar opiniões a terceiros, estrangeiros, das características, pessoais e políticas, daqueles portugueses que mais recentemente foram chamados a assumir a responsabilidade da chefia do governo do país, de acordo com as escolhas dos eleitores nacionais. Ao fazê-lo, o PR, além de beliscar o respeito devido aos chefes de governo escolhidos pelo povo, está a permitir-se manifestar um poder que não tem – e que a Constituição não lhe confere – que é o de apreciar e julgar os actos e atitudes pessoais de membros do órgão de soberania Governo.
Mais, enquanto órgão de soberania e mais alto magistrado da nação, o PR tem o dever acrescido de ser elemento agregador da unidade e identidade do Estado e de dar bons exemplos de cidadania e de conduta social, abstendo-se de opiniões ou apreciações menos positivas, quiçá negativas, em público e muito menos em fóruns não nacionais.
Agindo como agiu, tendo dito o que disse, ao invés de contribuir para o reforço e consolidação da identidade nacional que, primeiramente e acima de tudo, lhe cumpre fomentar, deu azo à polémica e não prestigiou as instituições da República.
Quanto às farpas dirigidas à PGR, apesar de parcialmente pertinentes pela ausência de qualquer explicação da sua parte pelos danos irreparáveis que já causou à democracia, também eram escusadas pois ela mais não fez do que exercer os poderes que detém.
Já no tocante ao pagamento das indemnizações decorrentes da descolonização, porque não começar pelo pagamento aos portugueses retornados das ex-colónias e espoliados dos seus haveres cujas relações, há muitos anos entregues ao Estado, continuam sem resposta destes 50 anos depois de ABRIL?
Valha-nos Santa Maria de Belém!