Caro eleitor, vá preparando a caneta porque vai precisar dela para votar, mais uma vez e extemporaneamente, no próximo dia 18 de maio. Isto, claro está, se não quiser abster-se de participar num sistema em que os políticos, seja por incapacidade, inépcia, desinteresse ou calculismo, mais não fazem senão mandar-nos votar. Até parece crerem que o voto purifica os eleitos, mas a realidade parece provar o contrário e, de eleição em eleição, a qualidade e eficácia da governação diminuem e a democracia sai mais fragilizada.
Passados 50 anos desde o 25 de Abril, Portugal teve 30 Governos, dos quais 6 foram provisórios, tendo governado de 16 de maio de 1974 a 23 de junho de 1976, e 24 constitucionais, entre 1976 e 2025. Não considerando os provisórios, a duração média dos Governos constitucionais cifra-se em cerca de 2 anos, ou seja, metade da duração da legislatura constitucionalmente estabelecida, o que, convenhamos, é manifestamente insuficiente para assegurar uma boa governação do país.
O actual Governo iniciou funções em 02 de abril de 2024 e caiu, por sua própria iniciativa, antes de completar um ano de exercício e de apresentar ao país resultados palpáveis da sua governação que permitissem aos portugueses avaliar e julgar o seu desempenho. E caiu porque Luís Montenegro, PM e chefe do Governo, ao invés de prestar ao Parlamento – que nos representa a todos – os esclarecimentos acerca das suspeições vindas a público sobre a desconformidade ou deficiente cumprimento das suas obrigações pessoais, enquanto titular de alto cargo público, se escusou a prestá-los cabalmente.
Com efeito, ao invés de dar as informações pedidas e legalmente devidas sobre tais actos, o PM foi dando algumas a conta-gotas mas depressa começou a dizer que já as tinha dado todas, o que não era exacto, acabando por se enredar na teia que ele próprio criou e deixando várias pontas soltas sem resposta, como se viu e leu na comunicação social.
Mas não satisfeito, o PM que, em primeira análise e por respeito ao mandato recebido dos eleitores, tinha por dever primordial continuar a governar o país, em vez de aceitar o escrutínio democrático, decidiu desafiar o Parlamento a reiterar-lhe a confiança fortemente abalada com as suspeições surgidas, resultantes, unicamente, das trapalhadas em que se enredou e que não conseguiu explicar.
Em suma, ao invés de uma explicação clara e transparente, como estava obrigado, o PM preferiu a fuga para a frente e confrontar o povo com a tarefa, prematura e descabida, de ir de novo a votos e assim decidir se o iliba das suspeições que o envolvem, lhe renova a confiança e o indigita para novo mandato.
É claro que as eleições fazem parte da essência das democracias e do seu regular funcionamento, servindo para avaliar o mérito ou demérito da acção dos eleitos no exercício dos cargos para que foram escolhidos, nomeadamente na função governativa, e os seus resultados. Mas esta precipitada ida às urnas ocorre, não para avaliar esses resultados, escassos porque temporalmente reduzidos, mas sim a pessoa do PM e a sua duvidosa conduta ética.
Numa altura em que o mundo atravessa a maior crise de segurança após a segunda guerra mundial e o país vive uma complexa e grave crise social em sectores como a saúde, habitação e educação, esperava-se do actual governo, ou de qualquer outro em idênticas circunstâncias, que, honrando e privilegiando a confiança dos eleitores, se preocupasse, acima de tudo, em governar, assim contribuindo para a melhoria das condições de vida dos seus cidadãos e salvaguarda dos superiores interesses de Portugal, mas nada disso aconteceu.
Montenegro até pode estar a contar com a brandura e benevolência dos eleitores, mas, mesmo que de novo eleito, jamais se livrará da suspeição de não ter parecido sério.