A panóplia de pratos, petiscos e sobremesas confecionadas à base de chícharo voltou a atrair muitos visitantes e fazer as delícias de quem se sentou à mesa em Alvaiázere, no primeiro fim-de-semana de outubro. A 21.ª edição do Festival Gastronómico ‘Alvaiázere Capital do Chícharo’ confirmou o poder de atração desta leguminosa, trazendo “milhares e milhares de pessoas” para degustar iguarias, adquirir produtos regionais e celebrar as tradições locais. No entanto, o evento, que é um dos cartazes turísticos do município, foi também palco de um “importante pedido”: desanexar Alvaiázere da Denominação de Origem Protegida (DOP) do Azeite do Ribatejo.
Milhares de pessoas acorreram a Alvaiázere, não só para se deliciarem com o chícharo, mas também para provar e adquirir o melhor que o território tem para oferecer: dos queijos artesanais aos enchidos, dos vinhos ao azeite, do mel puro à doçaria, dos licores aos frutos secos. Tudo isto temperado com a simpatia e o bom receber dos alvaiazerenses, algo que o presidente da Assembleia Municipal, Carlos Graça, destacou como “a nossa forma humilde, mas simpática e humana de bem receber”.
DO PRATO PARA O DEBATE: O AZEITE NO CENTRO DA LUTA
E se o chícharo foi a estrela do prato, o azeite de Alvaiázere foi o centro do debate político. Aproveitando a presença do secretário de Estado da Agricultura, João Moura, o presidente da Câmara Municipal, João Paulo Guerreiro, não perdeu tempo em lançar um desafio crucial no que toca à valorização da agricultura local e regional.
O autarca aproveitou a presença do governante para apresentar o que classificou como “a nossa maior luta neste momento”: a desanexação do concelho de Alvaiázere da DOP (Denominação de Origem Protegida) do Ribatejo no que toca ao azeite.
“O nosso concelho está anexado à DOP do Ribatejo. Seria necessário conseguirmos fazer essa desanexação para que nos pudéssemos juntar com aqueles que são mais identitários connosco, com aqueles que mais têm em comum e com quem realmente partilhamos sinergias e muita, muita identidade territorial”, afirmou João Guerreiro, referindo-se às Terras de Sicó.
O autarca argumentou que as características do olival de Alvaiázere são idênticas ao das Terras de Sicó: predomina a azeitona galega e a produção tradicional, não intensiva. Esta ligação, defende, é muito mais forte do que a atual com o Ribatejo. “Alvaiázere e algumas freguesias de Pombal estão presas num agrupamento que, infelizmente, não nos acrescenta nada, com quem não conseguimos dialogar e com quem os produtores têm diferenças, não têm ligações”, sublinhou.
João Guerreiro justificou a importância desta mudança para se conseguir obter uma IGP (Indicação Geográfica Protegida) para o azeite de Sicó, que ao incluir os produtores de Alvaiázere, permitiria às Terras de Sicó “ganhar escala” e dar o devido valor a um produto de “excelência”. Assim, o edil pediu o apoio do secretário de Estado para que esta situação seja resolvida no mandato da sua presidência na associação de desenvolvimento Terras de Sicó, que termina em maio de 2026.
GOVERNO DISPONÍVEL, MAS O PASSO TEM DE PARTIR DO TERRITÓRIO
O secretário de Estado da Agricultura, João Moura, que elogiou a qualidade do azeite português, considerado “um dos melhores do mundo”, mostrou-se recetivo ao desafio. Apontou, no entanto, que a iniciativa tem de partir do território.
“Eu ajudarei nesta tarefa”, mas “a bola está do vosso lado, são vocês que têm de pedir, solicitar a retirada da DOP Ribatejo. Não é uma situação normal, mas é respeitada. Retirem-na e logo a seguir vamos tratar e cá estarei para ajudar”, garantiu João Moura, sugerindo depois a criação de uma Indicação Geográfica Protegida (IGP) para o azeite das Terras de Sicó, “um selo de qualidade, a marca de uma identidade”.
TRADIÇÃO QUE SE REINVENTOU
O festival em si foi, mais uma vez, o grande motivo de festa. João Guerreiro lembrou os dois alvaiazerenses que, há 23 anos, tiveram a “feliz ideia” de criar um festival à volta do chícharo, um “produto conhecido” que “estava a entrar em desuso”. Uma ideia que, segundo disse, se transformou num “excelente produto de marketing territorial” com um “grande impacto em toda a comunidade”.
Carlos Graça, presidente da Assembleia Municipal, reforçou esta ideia, classificando a aposta no chícharo como “comprovadamente ganha”. “Num município em que o turismo desempenha um papel fundamental no desenvolvimento local, valorizar os produtos endógenos e a nossa gastronomia são pilares importantes para a melhoria da qualidade de vida”, afirmou.
Para além das tradicionais tasquinhas dinamizadas por associações do concelho, que promoveram uma variedade de pratos com chícharo, o evento contou com um concurso gastronómico, showcooking e uma inovação que promete dar que falar: a apresentação do ‘Super Chícharo’, a nova mascote que, com “muita animação e ainda com mais alegria”, vai levar o nome de Alvaiázere mais longe.
No final, o Festival Gastronómico ‘Alvaiázere Capital do Chícharo’ provou, mais uma vez, ser muito mais do que um evento dedicado a uma leguminosa. É um motor da economia local, um veículo de promoção das tradições e, agora, palco para uma reivindicação histórica que pode redefinir a identidade de um dos produtos mais ancestrais da região: o azeite.



